Imagine, no entanto, a maravilha que é poder transformar energia em matéria. Transformar o próprio campo eletromagnético em partículas, isto é, fazer com que um quantum de luz dê origem a um par partícula-antipartícula. Minha estupefação foi precedida pela de muitos outros, como a de Victor Weisskopf ao comentar no anos de 1930 os avanços de P.A.M. Dirac na teoria do elétron, de 1928.
Atualmente, o processo de criar e aniquilar partículas está muito bem estabelecido na MQ. Na verdade, estes processos são, aparentemente, exclusivos da MQ. No entanto, o entendimento de que partículas poderiam ser criadas e aniquiladas aos pares antecede a MQ, datando do início do século XX. Por exemplo, os físicos acreditavam que bastava que as partículas tivessem cargas opostas para se aniquilarem (prótons e elétrons). Sabemos que não basta apenas isso, hoje em dia.
Preciso ressaltar, ainda, que há duas versões de interpretação para a MQ. A versão corrente dos livros-textos (que vem da chamada "Escola de Copenhagem", defendida por Bohr) e a de David Bohm, que não possui formulação relativística. Então, quando eu disser MQ daqui por diante, estarei me referindo ao que é comumente aceito nos bancos universitários.
Bom, na MQ a definição do vácuo é fundamental, pois é deste estado físico que vamos retirar e colocar partículas. Mas o que é o vácuo quântico? Bom, para começar, ele nada tem a ver com o vácuo clássico, aristotélico, que significa a ausência de tudo. No caso quântico, o vácuo não é a ausência de tudo, mas apenas um estado físico (o de mais baixa energia possível) preenchido por campos quânticos onde partículas e antipartículas (aos pares) podem surgir (criadas) e desaparecer (aniquiladas) em átimos de tempo. Aceito isto, precisamos encontrar algo que possa atuar sobre o vácuo. Isto é, precisamos de uma entidade matemática que, ao se aplicada no vácuo (que é um estado físico), produza alguma alteração no mesmo. Para isso, são utilizados os atuadores. Não, minto, os alteradores. Não, minto de novo. O nome correto é operadores. Os operadores são entidades matemáticas que atuam sobre uma determinada função matemática (que no caso representará o vácuo), produzindo uma modificação em seu estado. A MQ é uma teoria linear, isto é, ela é descrita por meio de quantidades lineares, incluindo os operadores, que são todos lineares.
Parece complicado, e é mesmo. Primeiro, é necessário que definamos que os operadores que vamos usar não comutem. Como? Que?! Comutar é...sejam A e B dois operadores. Para que eles comutem, devemos ter AB - BA = 0. Para que não comutem, AB - BA = C, onde C não pode ser o operador nulo (grosso modo, zero). Por simplicidade, assume-se que C = 1, mas não faz diferença o que seja. Definimos, então, o comutador de A e B como [A,B] = AB - BA. Repare, então, que o que dissemos até aqui foi: se primeiro aplicamos A e depois B num determinado estado físico, isto não é o mesmo que aplicar B e depois A. Moleza. Tenho certeza que você pode encontrar exemplos disso no seu dia-a-dia. Por exemplo, para dar uma dica: coloque seu celular sobre a mesa e 1) gire para a esquerda em 90 graus e 2) levante em 90 graus com relação ao tampo da mesa; agora faça 2) primeiro e depois 1). Deu o mesmo resultado? Claro que não. Então você tem que os operadores 1) e 2) não comutam (não produzem o mesmo resultado final)
Por que isso, Sergio? Por que os operadores não devem comutar? Bom, primeiro devo dizer qual é a vantagem deles comutarem. Se dois operadores A e B comutam, então AB - BA = 0, o que equivale a dizer, na linguagem da MQ, que ambos podem ser observados ao mesmo tempo. Sendo assim, tudo o que puder ser descrito por estes dois operadores ao mesmo tempo, será descrito. Do ponto de vista matemático, então, dizemos que A e B formam uma base para este espaço de observação. Assim, operadores que comutam podem formar uma base no espaço de obervação. E se os operadores não comutarem? Então eles não são observados ao mesmo tempo e não podem formar uma base. O exemplo mais batido é o da posição e momento de uma partícula: se você sabe onde está a partícula, não sabe quanto exatamente ela tem de momento e vice-versa. Ou seja, posição e momento não formam uma base para descrever o comportamento de uma partícula.
Mas e por que devemos usar operadores que não comutam, mesmo? Oras, grosso modo, eu não quero produzir uma partícula que possa ser descrita numa base onde ela existe e não-existe ao mesmo tempo. Ou ela existe ou não-existe, não é uma condição dual. Assim, meus operadores que irão atuar na vácuo quântico irão descrever a criação e aniquilação de uma partícula, mas nunca um estado de coexistência.
Outra coisa importante é: um operador ao ser aplicado a uma função precisa produzir algo que seja passível de verificação (experimentação). É necessário produzir um valor (algo quantificável). Desta forma, o operador que cria uma partícula quando aplicado ao vácuo, precisa produzir (aumentar) uma partícula. Já o operador que destrói a partícula quando aplicado ao vácuo, precisa reduzir o número de partículas (caso já haja partículas) de uma partícula. A função que descreve o vácuo é chamada de autoestado. O resultado numérico que se obtém ao aplicarmos um operador a um autoestado é chamado de autovalor.
Há várias questões formais para descrever tudo o que está dito acima, que demandam bastante formalismo. No próximo post mostrarei um pouco disso tudo. Precisarei de alguns posts para podermos chegar na criação de partículas por buracos negros, que é o que o Hawking fez.
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