Não sei se alguém viu a recente fantástica medição do momento anômalo do muon?! Não? Vixe...
Então vamos lá. A descoberta do muon é interessante e pode ser vista como um teste da Relatividade Especial (RE). O tempo de vida dessas partículas é muito pequeno, da ordem de 2 milionésimos de segundo. Os pions, partículas muito interessantes também, ao interagirem com os átomos da atmosfera (vindos do espaço) decaem naturalmente em muons.
Como tem um tempo de vida muito curto, o muon rapidamente decai em outras partículas um pouco mais estáveis, como elétrons e pósitrons (e neutrinos).
Isso faz com que os muons sejam praticamente invisíveis aos núcleos atômicos presentes na atmosfera (ou seja, descem em linha praticamente reta até a superfície terrestre). Oras, oras, o que precisamos procurar aqui embaixo na superfície, então? Muons que não tiveram tempo de decair, ainda. Mas exatamente quantos chegam na superfície? Bom, a contagem pode ser feita pela expressão simplérrima, como para qualquer decaimento, escrita abaixo
O caso (1) se refere ao valor clássico (sem RE), enquanto que (2) é para o caso onde vale a RE. Mas por que precisamos usar a RE? Porque a velocidade do muon é muito elevada, próxima da velocidade da luz c. O cálculo clássico (1) para uma atmosfera de 15 km fornece mais ou menos 130 muons chegando na superfície a cada 1 trilhão. Usando (2) e a correção relativística (3), calcula-se o número de mais ou menos 630 bilhões de muons atingindo a superfície a cada 1 trilhão de eventos. Este número concorda com o que é medido, como constataram
Carl D. Anderson e Seth Neddermeyer (1936) e J. C. Street e E. C. Stevenson (1937).Agora voltando ao momento anômalo do muon. O pião executa um tipo de movimento quando gira em torno do seu próprio eixo chamado precessão. O mesmo acontece com o giroscópio, como pode ser visto nesse vídeo. Os elétrons, por exemplo, também apresentam um movimento semelhante quando submetidos a um campo magnético forte. Eles agem como se houvesse um pequeno ímã dentro deles que, ao interagir com o campo magnético forte, oscila, fazendo com que a partícula apresente o mesmo comportamento do giroscópio.
Esse ímã interno é, na verdade, o momento de dipolo magnético da partícula. Esse momento, ao interagir com o campo magnético externo, faz com que a partícula gire. Ou seja, esse momento magnético de dipolo obrigatoriamente tem origem vetorial.
Os muons, que são partículas elementares de carga -1 e massa ~200 vezes maior que do elétron, apresentam o mesmo comportamento. Ao serem imersos em um campo magnético extremamente intenso passam a girar porque o seu momento magnético de dipolo interage com o campo magnético externo. Essa oscilação (ou taxa de precessão) depende da intensidade do momento de dipolo magnético do múon. Esse momento de dipolo recebe a letra g como identificador (g de giromagnético). Como ocorre com todas as partículas, suas propriedades devem ser medidas para que funcionem como testes daquilo que é previsto teoricamente.
Dentro do Modelo Padrão (MP), que é o que temos no momento, está previsto um momento de dipolo magnético para o muon visto na faixa verde da figura abaixo, obtida aqui (há um vídeo bem legal também). Ocorre que os valores medidos experimentalmente são maiores, vistos na outra faixa. Essa diferença é de cerca de duas unidades e, por isso, o que se procura é o g-2 (gê menos 2). O artigo com o experimento está aqui.
A previsão do MP é absurdamente precisa e leva em conta todas as interações que o muon pode ter (com campos e outras partículas conhecidas). Isso torna as coisas mais intrigantes ainda, pois se tudo o que é conhecido foi levado em conta, como explicar a divergência entre o que é calculado e o que é medido?
A primeira resposta é: flutuação estatística. Os processos envolvidos podem conter algum grau de aleatoriedade, resultando no que se chama de flutuação estatística. Explicando de outro modo: os dados mensurados para um mesmo experimento podem resultar em valores ligeiramente diferentes (por variações de pressão na sala, temperatura, etc.). Essa variabilidade é chamada de flutuação estatística. Em geral, procura-se retirar toda e qualquer flutuação estatística, ainda mais num experimento deste porte. Então, é pouco provável que o resultado obtido seja devido a algo deste tipo. Mas não é improvável.
Por outro lado, se não é flutuação estatística, então o que é? Se a interação do muon com todos os campos e partículas foi considerada no cálculo do momento anômalo, então só nos resta apelar para o que não é conhecido. É ai que a porca torce o rabo! Se há necessidade de se usar partículas não previstas no MP, então o Modelo Padrão já era. Estamos falando de física nova, ALÉM do MP. Não que o MP já não apresentasse problemas antes disso. Ele não explica a hierarquia de massa, a instabilidade do vácuo e por ai vai. Ou seja, ele não está feito e acabado (e por isso é só um modelo).
Há inúmeras variantes que descrevem a física além do MP, todas bastante complicadas e com suas próprias previsões (inclui a variante que prevê matéria escura, por exemplo). Um pequeno review pode ser visto
aqui (of course, my horse, em inglês).
Há detalhes dos experimentos que deixarei para um outro post. Por hoje é só.
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